Resenha: A reviravolta da História
A
queda do muro de Berlim e o fim do comunismo
Marc
Ferro 2011
Em uma análise pessoal, partindo de um princípio de
que seus leitores são conhecedores dos fatos, Marc Ferro em seu ensaio nos
apresenta a derrocada do comunismo através de relatos de fatos e experiências
em países socialistas e capitalistas durante a Guerra Fria. Por falta de
fontes, a “imparcialidade histórica” é deixada de lado e alguns argumentos
ficaram vagos, o que não tira o valor do trabalho.
O muro de Berlim, símbolo da guerra de força e
ideológica entre capitalistas e socialistas, edificado em 1961 e derrubado em
1989, representou a imagética comunista do século XX, dividia Berlim, capital
alemã, ao meio, porém não tinha uma função defensiva militar como a muralha da
China por exemplo.
Foi usado para extinguir o êxodo de berlinenses e
outros alemães da República Democrática Alemã (RDA) para a República Federal
Alemã (RFA). Fora uma defensiva da extinção do regime, pois o atraso
tecnológico imposto pela URSS aos países ‘colonizados’ ante o avanço apoiado
pelos EUA aos países ‘imperializados’ era decisivo na escolha do lado em que o
povo se definia em ficar.
A queda do muro não foi simplesmente alvenaria e concreto
indo ao chão, por 1989 ser o ano do bicentenário da Revolução Francesa, teve
uma simbologia posteriormente atribuída a ela, o fim do comunismo e o fim da
URSS. Algum tempo após a queda do muro, a Alemanha se reunificou e a cisão da
Europa em dois blocos findou-se.
A análise de Ferro não é simplesmente acerca da
queda do muro, mas de vários os motivos para que isso ocorresse. A política da
perestroika de Gorbachev, que abriu as liberdades na extinta URSS, a pressão de
Iéltsin, que ‘curiosamente’ sucedeu Gorbachev no comando da Rússia, a política
de Kohl, que afirmava: “a unificação alemã e europeia eram duas faces de uma
mesma moeda” e a pressão popular ocidental para o fim da Guerra Fria.
O pacto de Varsóvia não agradava a opinião pública,
assim como a Comecon, por não levar o desenvolvimento a nenhum país
participante. Os países da cortina de ferro não concordavam em servir de escudo
a um sistema falido. A Alemanha se unificava e o desenvolvimento seguia rumo a
leste novamente fazendo da nação outra vez um país desenvolvido.
A iniciativa de Gorbachev de abandonar a política
repressiva não foi bem vista pela população que não via vantagens nisso. No
entanto o regime não suportava mais a pressão de todos os lados. Ao autorizar a
liberdade de informação, início de uma liberdade de expressão, acredito que
talvez Gorbachev estivesse disposto a findar o regime extremamente falho, pois
era dispendioso demais para se sustentar por si só.
A falta de
controle a que o governo se via atado, pois dominar um país imenso, de diversas
etnias e religiões, que iniciavam um processo de independência da URSS, era um
problema que sempre fora negado e ocultado, assim como os aspectos de disfunção
do Estado, estava sendo descoberto pela liberdade que a imprensa obtinha cada
vez mais.
O sistema socialista se via em franco declínio pela
exploração dos trabalhadores, onde o surgimento do sindicato da solidariedade
fora combatido e repreendido a força pelas autoridades. Frases como:
Muitas vezes, os
dirigentes sindicais não passam de criados dos diretores das fábricas.
Cabe aos sindicatos,
antes de mais nada, defender os direitos dos trabalhadores, mas eles não
poderiam fazer grande coisa se não reforçássemos a disciplina do trabalho e se
a produção não aumentasse.
A greve não é proibida,
mas ela não é normal neste país.
Mostram que assim como
no capitalismo, o interessante não é o bem comum dos trabalhadores, mas o que
estes são capazes de produzir.
Afirmações como as supracitadas, comuns de se ouvir,
entender e compreender na sociedade capitalista neoliberal de exploração máxima
da mão de obra, segundo as ideias marxistas não deveriam sequer ser imaginadas
numa sociedade comunista ou socialista. Por esse motivo, talvez a URSS não
obteve êxito em suas conquistas e se viu obrigada a regredir e consequentemente
acabar.
A falta de suprimentos, a desvalorização monetária,
o processo de privatização, a liberdade política, liberdade de imprensa e
expressão, a estratégia de democratização, a falta de unidade e sentimento
nacional por conta de nações que integravam a URSS, conflitos entre as nações
pertencentes ao país foram algumas das causas do complexo processo do fim da
URSS segundo Ferro.
Há dúvidas acerca da política perestroika de
Gorbachev, se teria sido uma forma de tentar salvar o regime falido e assim
manter o socialismo, ou se sua intenção fora de findar com o falho sistema. De
acordo com a primeira alternativa seria um fiasco, porém se sua real intenção
tenha sido a segunda, o sucesso é inegável e legitimo.
Gorbachev assolara as bases do poder do Estado, por
isso sofreu tentativas de golpe de estado frustradas, no entanto se viu
obrigado a renunciar. O que se seguiu foi uma série de conflitos e independências
dos países formadores da URSS, a exceção da Tchetchênia que tem recursos
petrolíferos, portanto uma fonte de riqueza estratégica. Porém os tchetchenos
buscaram sua liberdade e o que se sucedeu foi uma série de conflitos nessa
região, com a manutenção do poder russo na região.
Em seu ensaio sobre o fim do comunismo, Ferro cita
obras cinematográficas, entre as quais Adeus
Lênin e A vida dos outros, para poder exemplificar e explicar a
nostalgia dos países do leste europeu em relação ao antigo regime. Graças às
visões deturpadas que o Ocidente tinha do regime socialista, como paraíso dos
trabalhadores, ou como fonte de violência indescritível, a expansão do
comunismo pelo leste europeu preocupou a sociedade.
Porém ficou claro com o fim do regime que os ideais
da Revolução Russa foram distorcidos, portanto o poder socialista ficou fadado
ao fracasso. Tanto é real que mesmo com o capitalismo crescendo e se
estabelecendo na Rússia, o poder mantém-se com os mesmos líderes políticos. O
próprio atual presidente russo, Vladmir Putin era membro da KGB, agência de
inteligência e espionagem russa.
A queda do regime socialista do Oriente pode ter se
dado porque o regime se instaurou em um contexto que provavelmente não estava
pronto para chegar ao comunismo, pois segundo Marx, o comunismo se dará a
partir da revolta do proletariado explorado a extremo, a Rússia de 1917 era
praticamente feudal, é como se tivesse pulado a etapa do mercantilismo da
teoria marxista. As teorias devem ser testadas, de acordo como são
estabelecidas, adaptadas à realidade, pois geralmente são utópicas. Eis um dos
grandes erros dos russos ao se precipitarem em estabelecer o socialismo antes
de terem a mais valia como base das relações sociais.
Porém o século XX foi de grande valia a Rússia,
apesar dos genocídios, guerras, terrorismo, o crescimento tecnológico e
industrial obtido em apenas um século foi equivalente aos cinco séculos de
desenvolvimento no Ocidente. Do mesmo modo, a sua queda foi proporcional ao seu
crescimento, pois ideologias são distorcidas quando da passagem do poder. Cada
homem tem uma visão diferente do outro, assim o modo como se dirige uma nação
se modifica a cada passagem de poder, ou até mesmo dentro de um mesmo governo.
A queda do Muro da Vergonha, como ficou conhecido na
década de 1990, não foi causa do fim do comunismo, todavia foi uma mostra da
fraqueza vivida pelo Estado socialista à época. A unificação alemã foi penosa à
Alemanha, pois o leste estava totalmente desestruturado.
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